Resenha: Notas sobre o luto, Chimamanda Adichie

Yasmin Chinelato
2 min readFeb 24, 2022

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Como é possível o mundo seguir adiante, inspirar e expirar de modo idêntico, enquanto dentro de mim tudo se desintegrou de forma permanente?

Fazia poucos meses que eu tinha perdido meu pai quando assisti à Chimamanda em uma entrevista do Roda Viva. Ela falava sobre este livro; sobre a experiência do luto e o peso que tudo aquilo teve sobre ela. Suas palavras me tocaram de tal forma que eu quase imediatamente abri uma nova aba no navegador e fiz um pedido na amazon.

O que o pacote me trouxe foram pouco mais de cem páginas de um texto brutal, com as quais me conectei de tal forma que por muitas vezes precisei deixá-las de lado. Era simplesmente duro, amargo demais para que pudesse digerir.

No dia 18 de janeiro, há poucos meses de completar um ano que mergulhei em meu próprio processo de luto, terminei esta leitura. E de alguma forma sinto que este livro me acompanhou. Não que as notas de Chimamanda ou os fragmentos dos diários de Barthes, aos quais também recorri, mudassem alguma coisa na pessoalidade deste caminho — que, afinal, trilhamos sozinhas — mas suas palavras me fizeram encontrar conforto; trechos que refletiam minha própria experiência, frases que pareciam capazes de amenizar uma dor tão grande como quem sussurra “você não é a única”. Porque o luto não é um vazio, mas os pedaços de um todo — de repente transformados em um material efêmero que nunca mais voltará a ter a mesma forma. Memórias de um pai, espectros de sua convivência, os valores ou as histórias que ele lhe ensinou. São estes pedaços, também, que Chimamanda articula em seu livro, entrecortados entre relatos da experiência de sua própria travessia — em meio a uma pandemia, o que faz tudo mais difícil de enfrentar.

Este livro é uma homenagem a memória do homem que foi James Nwoye Adichie e do legado que deixou refletido em sua filha. É, sobretudo, um desabafo; o relato incômodo que busca encontrar um conforto que não existe em outro lugar se não na escrita.

[Créditos também à tradução de Fernanda Abreu, que transpôs tão bem estas palavras]

Resenha publicada originalmente no goodreads.

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